6h30: acordo.
6h31: ele diz pra ficar mais um pouco. Não fico. Ele não
entende por que eu preciso levantar a essa hora, se o mundo dele ainda está
dormindo. Mas eu sei, então não explico muito. “Descansa mais, tá tudo bem.”
6h35: após a primeira mijada do dia e uma escovação de
dentes que tem mais função de despertador do que
qualquer-coisa-higiênica-e-bonita, passo pelo quarto das crianças. Roncos. Que
bom.
6h36: abro a porta que separa o corredor da sala. Domingos,
o maltrapilho, soltou tanto pêlo que mal consigo respirar. Eles vêm aos tufos,
pretos e espessos feito macarrão de Jedi. E o crioulinho ainda me pula na cara,
com seus muitos-quilos-a-mais-que-eu, feliz e matinal, antes de se espantar com
meu “sai” mal-humorado de péssima dona de cão. Désolée, Domingos. A vida me fez
assim.
6h37: pego a vassoura.
6h38: vou varrendo, vou varrendo, vou varrendo, vouvarrendo.
(sério, clique no link acima)
(sério, clique no link acima)
6h45: NET negocia. Boleto do condomínio. 04/36 em atraso do
carro. Spam, spam, spam. 36 pessoas pedem sua amizade no facebook. 48 pessoas
perguntam por que você não aceitou ainda pedido de amizade no facebook.
Telefônica cobra. Comgás cobra. Quem mandou abrir e-mail tão cedo?!
6h46: alguém espirra. Eu só torço pra que o espirro pingue
como mais uma horinha de sono, ai, que gostoso. Cubro os dois e volto pro
quarto escuro. Não são nem 7h e a vida já pipoca feito piruá na mão do saci.
6h47: eu deito do lado dele e juro que tento fechar os olhos
pra dormir mais meia hora antes de levar o mais-pequeno pra escola. Mas
acontece que ele já tá lá, na porta entreaberta: o saci. Minha sogra esconjura,
diz que é coisa do demônio; minha mãe e meu pai liam sagas de Monteiro Lobato com voz de
preto velho pitando – e eu acreditava naquilo mais do que nas rezas benévolas
da minha vó; meu marido brinca, mas à noite dorme e pede pra não deixar porta
aberta. É que ele sabe do moço que espreita pelas frestas: o saci.
6h59: eu olho pra ele, ele olha pra mim. Ninguém fala nada.
Ninguém pode saber. Ele dá uma piscadinha pra mim e sai, pululicando a vida. Me
deixa contas a pagar, estragos a consertar, conversas por ter. Filhodaputa de
saci, sempre arreliando minha vida. E ainda saco por que não reconheci o espirro, geralmente tão familiar. Era pra
infernizar, pra me fazer torcer o paninho. Me sinto tão tio barnabé que nem consigo
me mexer.
7h: bom dia. Que dia é hoje? Nem sei. É que todo dia é dia
do saci.
Feliz que você voltou!
ResponderExcluirSe não conseguimos derrotar nossos sacis, aliamo-nos a eles.
Um beijo.