Os franceses são referência em uma série de coisas: vinhos, roupas, comida. Tudo com um “e” gigante de “elegância”. Beber, vestir, comer e falar francês é chique. E eu, que vivi cinco anos na França e fui alfabetizada nessa língua cheia de erres e bicos, demorei uma boa década pra sacar o porquê disso tudo. Daí leio que nossa garotada brasileira tá ficando gordinha e me pergunto por que os franceses não estão com ESSE problema (assim, grande e maiúsculo, porque eles estão com todos os outros, do desemprego à crise de consciência, merci!).
Acontece que os franceses
sabem comer. Mas atenção: isso que a gente conhece aqui como “comida francesa”
feita em pseudo-bistrôs não é nada do que se tem por lá. Esqueçam. Francês SABE
comer. Me lembro de cada detalhe. Na cantina do colégio, hora do almoço, a
ordem era sempre a mesma, nas
quatrocentas-mesas-de-oito-lugares-para-oito-crianças: pão, entrada, prato
principal, tábua de queijos, sobremesa. Tudo em produção industrial.
Sim, tábua de queijos lá é ordem, não
elegância. É nutrição, não glamour. E na casa das amigas loiras de blusa
xadrez, os pais me obrigavam lá do alto a sugar com força o que tinha dentro da
cabeça dos camarões cozidos. Eu fazia cara de nojo e as Françoises,
verruga-na-ponta-do-nariz, me diziam: “Allez, Bianca, já vivemos até os
horrores da guerra!”. Minha mãe tentava explicar que a gente gostava da carne
bem passada, mas não tinha conversa. Eles serviam o boi sangrando e diziam: “'En
France', a gente come assim”. Pois bem. Aprendi a sugar a cabeça dos camarões e comer
boi gritando de tão vermelho e assim ensino meus filhotes tupiniquins, no alto
de seus 4 e 2 anos de idade.
“Ei, mas os queijos não são
gordos?”. Mais oui, monsieurs'dames. Só que criança francesa come
pãozinho, salada, carne mal-passada com legumes ao vapor, queijo gordo e fruta.
Sempre, todo dia, no almoço da escola e no jantar, em casa. Pergunta onde entra
o Cheetos? “Nullepart!” (ou seja – EM LUGAR NENHUM, cara pálida!).
O problema não é comer coisa
gorda. O problema é comer coisa gorda que não nutre nem a unha do pé do seu
filho. E mais: não adianta querer que seu filho coma direito se você senta do
lado dele e bate uma lasanha da Sadia ou um pedaço de pizza rapi-dez. Ele não
vai se convencer. A criança francesa come bem porque vê os pais comendo bem – e
é convidada a participar desse banquete diariamente, com gosto e gôzo, até que
o vinho tinto os separe (às vezes, para sempre).
Que critiquem os franceses
por sua total falta de tato. Mas que nunca os critiquem por não educar bem suas
crianças para a boa mesa – e a saúde que vem com ela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário